O jogo do networking para profissionais negros
Saiba como construir uma rede de contatos quando você sente que nunca foi realmente convidado para a conversa.

“Eu sou completamente incompetente em ‘como fazer amigos e influenciar pessoas’.”
Era assim que me via aos 20 anos, antes de ler pela primeira vez o livro de mesmo nome. Networking? Relações profissionais? Construção de conexões? Nada disso parecia natural para mim. Eu não tinha coragem de me aproximar das pessoas, achava que minha opinião não valia nada e, no fundo, nunca me senti realmente bem-vindo nas rodas de conversa dos profissionais ao meu redor.
Mas, 22 anos depois, quando li o livro pela segunda vez, percebi que algo havia mudado. Não só eu, mas também minha visão sobre o mundo corporativo e sobre como as conexões realmente funcionam para pessoas como eu.
E foi aí que uma constatação se tornou inegável: a maioria dos livros sobre como liderar ignora completamente as vivências e desafios do profissional negro. Se considerassem essa realidade, os conselhos seriam outros – menos ingênuos, menos baseados na ilusão da meritocracia. Porque, no nosso caso, a fórmula mágica de “Mindset de abundância” + “Consistência” + “Esforço” não resiste à realidade implacável do racismo estrutural.
Dito isso, como pesquisador, tenho uma hipótese: se os estudos e pesquisas sobre comportamento e liderança no mundo corporativo fossem verdadeiramente diversos, incluindo profissionais negros, os resultados seriam completamente diferentes. E talvez, só talvez, os manuais de sucesso profissional falassem menos sobre carisma e mais sobre estratégia de sobrevivência.
Mas voltando ao assunto sobre networking, esse é o quarto artigo da série Anatomia da Liderança Negra, em que estou desenvolvendo um guia passo a passo para te ajudar a construir sua jornada e conquistar seu lugar à mesa de liderança.
E, se você fosse meu aluno, eu te diria: no mundo corporativo, quem você conhece importa tanto quanto o que você sabe. O networking, ou a construção de redes estratégicas, não é um detalhe. É um divisor de águas. E eu espero que, depois de três artigos, você já tenha entendido: para nós, esse jogo não tem regras justas.
Então, vamos falar sobre como mudar isso.
Networking não diz respeito a simpatia – é estratégia
Você não precisa ser o mais extrovertido da sala. Você não precisa ter um dom natural para conversas casuais ou se forçar a ser alguém que não é. Mas precisa entender uma coisa: no mundo corporativo, quem não constrói redes constrói barreiras.
E para nós, pessoas negras, essas barreiras já são altas o suficiente.
Se você fosse meu aluno, eu te diria que networking não é bajulação. Não é ficar puxando conversa à toa no café ou rir das piadas sem graça do chefe. Networking é saber quem pode abrir portas para você – e, mais importante, como garantir que essas portas fiquem abertas.
Então, como construir uma rede de contatos quando você sente que nunca foi realmente convidado para a conversa? Como se tornar visível em um ambiente que muitas vezes prefere fingir que você não está ali?
- Expanda sua rede fora da bolha
A primeira armadilha do networking é a zona de conforto. É natural buscarmos conexões com quem se parece conosco – pessoas que compartilham nossa história, nosso background, nossa forma de ver o mundo. Mas, para crescer, é preciso atravessar essa barreira.
O que você pode fazer hoje?
- Participe de eventos profissionais fora do seu setor. Muitas vezes, as oportunidades vêm de lugares inesperados.
- Sim, aproveite mentorias e grupos de executivos negros – mas não fique restrito a eles. Construa pontes, não paredes.
- Seja intencional ao pedir indicações. Pergunte-se: quem pode me ajudar a chegar no próximo nível?
E, se você ainda não acredita no poder dessas conexões, deixe-me te contar algo: estudos mostram que 70% das oportunidades de emprego vêm por meio do networking. Isso significa que, muitas vezes, o cargo dos seus sonhos não será anunciado publicamente. Ele será preenchido antes mesmo de você saber que existia. O convite para a próxima grande oportunidade não vai chegar na sua mesa. Você precisa ir até ela.
2. Faça sua presença ser sentida
Uma vez dentro do ambiente corporativo, há uma segunda barreira: ser visto. Não basta apenas estar presente – é preciso ser notado.
Mas, veja bem, ser notado não significa falar o tempo todo. Não significa ser a pessoa mais animada da sala. Significa ter impacto.
A atriz Viola Davis disse algo que sempre me marcou: “O verdadeiro desafio para mulheres e pessoas negras não é apenas entrar no jogo, mas ser lembrado pelo que fizeram dentro dele”.
E isso vale para todos nós. Não adianta apenas conseguir um lugar à mesa da liderança – você precisa mostrar que pertence a ela.
Como?
- Seja estratégico em reuniões. Em vez de tentar falar o tempo todo, pergunte-se: qual é a minha contribuição mais valiosa aqui?
- Construa sua presença digital. Se as pessoas procurarem seu nome no LinkedIn, o que encontrarão? O que você tem feito para mostrar seu valor além das quatro paredes da empresa?
- Crie rituais de conexão. Pequenos gestos fazem a diferença. Enviar uma mensagem estratégica, agendar um café virtual, fazer um follow-up depois de um evento.
Pense em Barack Obama. Ele não era o cara que falava mais alto. Mas, quando falava, todos prestavam atenção.
Ser ouvido não quer dizer volume. É credibilidade.
3. Torne-se um conector de pessoas
O segredo do networking não é apenas conhecer pessoas – é conectar pessoas.
Nelson Mandela dizia: “O que conta na vida não é o mero fato de termos vivido. É a diferença que fizemos na vida dos outros que determinará o significado de nossa própria vida”.
Pessoas negras no mundo corporativo enfrentam desafios únicos, mas isso também significa que temos oportunidades únicas para fortalecer nossa comunidade.
Se você ajudar outros profissionais negros a crescer, estará construindo uma rede forte – e essa rede também te sustentará.
O que isso significa na prática?
- Apresente duas pessoas da sua rede, uma para a outra. Pequenos gestos de conexão criam oportunidades inesperadas.
- Seja um mentor. Sempre há alguém atrás de você na jornada que pode se beneficiar do que você já aprendeu.
- Compartilhe oportunidades. Recebeu uma indicação para um cargo que não faz sentido para você? Passe adiante.
Quando Oprah Winfrey fala sobre sucesso, ela sempre menciona a importância de levar outras pessoas com você. Você não precisa subir sozinho. Aliás, subir sozinho é o caminho mais difícil e mais solitário.
Networking não é interesseiro – é inteligência estratégica
Se você fosse meu aluno, eu te diria: construir redes não diz respeito a interesse. É inteligência. É se posicionar estrategicamente. É garantir que seu nome esteja nas discussões certas, mesmo quando você não está na sala.
E, acima de tudo, é lembrar que ninguém constrói uma carreira sozinho.
Barack Obama, Nelson Mandela, Oprah Winfrey, Viola Davis – todos eles chegaram aonde chegaram porque, em algum momento, alguém abriu uma porta. Mas, mais do que isso: porque eles também abriram portas para os que vieram depois.
Agora é sua vez.
Pare de lutar sozinho. Construa suas alianças. Fortaleça sua rede. E, acima de tudo, ajude outros a fazer o mesmo. Porque a mesa da liderança não precisa de um único negro solitário. Ela precisa de você – e de muitos outros.