Confiança é a nova moeda organizacional
As inovações do mundo do trabalho traz cada vez mais desafios, e o principal deles é o novo contrato psicológico de trabalho. Entenda as mudanças
O novo mundo do trabalho traz desafios profundos para a gestão de pessoas. A principal delas é que estamos diante de um novo contrato psicológico de trabalho.
Durante muitos anos, vivemos os modelos da obediência cega. Nele, o profissional aceitava as imposições de seu chefe e da organização sem muito questionamento.
A organização do trabalho e os movimentos de carreira eram definidos por comando e controle. Essa lógica foi predominante durante todo o processo de desenvolvimento industrial e entrou em colapso nos últimos anos.
No Brasil, após 1994, com a estabilização econômica e a maior possibilidade de fazer planejamento de vida, iniciou-se uma nova dinâmica das relações de trabalho.
Até então, em um país em que não era possível prever o preço do pão francês da semana seguinte, pensar a carreira e discutir questões como satisfação profissional eram ações inimagináveis. As pessoas viviam em modo de sobrevivência em um contexto de desordem econômica e inflação descontrolada.
O fenômeno da globalização também acendeu uma luz de alerta, em que a carreira não poderia ficar na mão da empresa. As mudanças mais frequentes de controle de capital, de estrutura e de novas habilidades determinaram um aumento necessário no protagonismo do indivíduo para cuidar da sua carreira.
Um grupo significativo de pessoas passou a questionar mais a gestão de sua carreira, a exigir líderes mais preparados para diálogos e a não aceitar mais o modelo de obediência cega.
Nesse cenário, surge um novo contrato psicológico. O funcionário da empresa não é mais um recurso que vai sendo utilizado de acordo com o projeto empresarial. Ele passa a avaliar o impacto do trabalho no desenho de sua vida, com temas de carreira, como saúde, família e propósito. E aí a confiança é a chave disso.
Em um recente estudo da consultoria Gartner, entre os fatores de perda de talentos na organização está a falta de perspectiva e diálogos de carreira: 68% dos entrevistados afirmaram não sentir confiança para discutirem, de forma aberta, os seus interesses de carreira com seus gestores.
A pesquisadora norte-americana Rachel Botsman estuda a confiança na nova economia e afirma que essa será a chave para as relações de consumo e de trabalho.
Em um de seus levantamentos, ela concluiu que apenas 20% dos profissionais sentem liberdade para dialogar de maneira transparente com seus líderes.
E 56% dizem preferir ter conversas de carreira com outras pessoas, porque sentem que o líder direto não irá ouvir ou poderá fazer retaliações, dependendo do rumo da conversa. Em dos artigos que escrevi para este aplicativo, mostrei que essa realidade se chama a deprimente necessidade de agradar o chefe.
Pela falta de confiança, o indivíduo diz para seu chefe aquilo que ele gostaria de ouvir sobre a sua carreira. Além de deprimente, isso significa o oposto do ambiente de trabalho ideal.
Os dados mostram que estamos diante de um grave problema. Boa parte das pessoas não sente confiança para dialogar sobre suas expectativas e tem receio de seus chefes, que ainda são viciados no modelo de comando e controle.
Temos um desafio fundamental de transformação cultural. Precisamos encorajar líderes a construírem relações de confiança e a entenderem que o gestor da carreira é o indivíduo, mas que é papel deles provocar reflexões e ajudar o profissional a construir seu projeto de carreira, a buscar oportunidades na área e em outros setores da empresa ou até mesmo no mercado se o ciclo na organização já estiver concluído.
A confiança e o interesse genuíno no desenvolvimento das pessoas são ações que aumentam o engajamento e serão cada vez mais cruciais para a gestão de pessoas.