Como fazer reuniões mais rápidas e produtivas
Um terço delas são inúteis, segundo os próprios participantes. Não à toa, "reuniões que poderiam ter sido um e-mail" se tornaram um meme. Mas com algumas estratégias simples dá para tornar os encontros mais significativos.
o primeiro dia útil de 2023, a gigante canadense de e-commerce Shopify anunciou aos seus funcionários uma mudança radical: a partir daquele dia, o objetivo de todos seria cortar o máximo possível de reuniões na empresa. Na contramão da cultura corporativa, a companhia declarou uma espécie de guerra aos encontros, fossem online ou presenciais.
Funcionou assim: todas as reuniões recorrentes com três ou mais participantes foram automaticamente canceladas, e os gestores foram orientados a remarcá-las apenas se realmente fossem necessárias. Reuniões grandes, com mais de 50 participantes, só poderiam acontecer uma vez na semana, num intervalo fixado nas quintas-feiras. Para as quartas, a instrução era não ter nenhum compromisso do tipo marcado. Mais do que isso, todos os 11 mil funcionários eram incentivados a repensar a necessidade dos seus encontros, e encorajados a dizer não a convites que considerassem inúteis.
Alguns meses depois, a Shopify desenvolveu um software que calcula o “custo” de cada reunião para a empresa (ou seja, o quanto, em dólares, aquele tempo poderia ter gerado se fosse gasto em trabalho per se). O programa é integrado às agendas virtuais dos funcionários e utiliza dados como o número de participantes, seus salários e a duração da reunião para atribuir um valor a cada convite. A ideia é dar informações para que todos avaliem se vale a pena mesmo investir o esforço naquela atividade.
Em setembro deste ano, executivos da companhia disseram que a política segue um sucesso – e que devem entregar 18% mais projetos por conta do ganho de produtividade que a mudança gerou.
O caso do Shopify é emblemático porque concretiza, de forma prática, uma sensação comum a quase todo mundo: fazemos reuniões demais no trabalho, e grande parte delas é inútil. Come tempo produtivo.
Nada mais desanimador, afinal, do que abrir a agenda do dia e ver uma sequência de compromissos, um colado no outro, alguns dos quais você nem lembra de ter marcado ou aceitado o convite. Não à toa, o conceito de “reuniões que poderiam ter sido um e-mail” virou meme universal.
Nem é de hoje. Peter Druck, considerado o pai da administração moderna, era um conhecido inimigo das reuniões. “[Elas] são um sintoma de má organização. Quanto menos, melhor”, dizia.
Não é só um sentimento abstrato. Há dados que mostram o tamanho do problema. Um estudo de 2022 é o mais completo nesse sentido. Nele, Steven Rogelberg, professor de administração da Universidade da Carolina do Norte e pesquisador especializado no tema, se juntou à Otter.ai, que vende um software para gravação de videoconferências, e recrutou 632 funcionários de várias empresas americanas para uma pesquisa. Os participantes responderam questionários sobre suas rotinas e como se sentiam em relação a elas.
A conclusão: cada profissional passa 18 horas por semana em reuniões. No caso de gestores, esse número sobe para 22,2 horas – praticamente a metade de uma jornada semanal de trabalho.
O ponto central, porém, foi outro: os entrevistados avaliaram que não precisariam aparecer em 31% dos encontros, quase um terço. Ao mesmo tempo, acabavam recusando, de fato, apenas 14% dos convites, porque se sentiam pressionados a estar presentes. Mesmo assim, no caso de reuniões online, 70% confirmaram que faziam outras coisas em paralelo ao longo do evento.
O estudo calculou que, com a queda de produtividade devido ao tempo inútil, empresas americanas com mais de cinco mil funcionários perdem no mínimo US$ 101 milhões todos os anos.
O diagnóstico está claro. O jeito, então, é declarar guerra às reuniões, e aboli-las quase por completo? Mais ou menos. O risco, aqui, são as consequências para a comunicação dentro empresa.
É que reuniões também são importantes. Os encontros, afinal, também funcionam como uma forma de unir e engajar as equipes; profissionais isolados podem se sentir solitários e pouco conectados com o emprego, especialmente em modelos remotos ou híbridos. Mais: algumas atividades, como brainstorming, só rolam dessa forma. Não há como fugir.
Além disso, empresas que não possuem muitos momentos de discussão e debate podem parecer autoritárias, apenas repassando informações de cima para baixo, o que também contribui para o desengajamento dos colaboradores.
E abolir só por abolir pode ser um tiro no pé. Foi o que aconteceu com a Zoom. Assim como a Shopify, a companhia decidiu, ainda na pandemia, instituir sua política de “quartas-feiras sem reuniões”, com nome autoexplicativo (havia exceções para encontros com clientes e gente de fora da companhia). O objetivo era reservar o dia para que os funcionários focassem no trabalho, sem distrações – a ideia se tornou uma certa moda entre startups americanas.
Em março de 2022, a empresa disse que 84% dos colaboradores apoiavam a medida. Mas durou pouco. Em agosto deste ano, a Zoom voltou a permitir reuniões às quartas-feiras, afirmando que a diretriz anterior prejudicava a colaboração interna. (Nessa mesma guinada, a empresa acabou com sua política de home office integral e exigiu a presença no escritório por dois dias da semana.)
O caso ilustra bem como uma medida isolada, em si, não resolve. É preciso repensar toda a rotina da empresa.
Pesquisadores do tema defendem que há estratégias científicas para tornar as reuniões inevitáveis menos estressantes e mais eficazes. Em seu livro The Surprising Science of Meetings (“A surpreendente ciência das reuniões”, sem versão em português), Rogelberg discorda de Peter Drucker e aponta que boas empresas se destacam justamente porque conseguem fazer poucas, mas produtivas, reuniões. Nos próximos parágrafos, um guia prático de como fazer isso.
Passo um: precisa mesmo dessa reunião?
O meme da reunião que poderia ter sido um e-mail não pegou à toa. O primeiro passo, e mais crucial, é justamente filtrar o que precisa de um encontro ao vivo e o que, definitivamente, não precisa.
Para Joseph A. Allen, professor da Universidade de Utah e diretor do Center for Meeting Effectiveness, uma reunião deve atender a dois critérios para justificar sua existência: ter um propósito definido e a necessidade de colaboração do grupo.
Significa o seguinte: informes que não precisem de debates maiores devem ser feitos de forma assíncrona, por e-mail ou mensagem de texto, pedindo a confirmação do recebimento – e reforçando que o espaço está aberto para dúvidas, comentários e discordâncias. Dessa forma, não atrapalha a agenda de ninguém. Se aquilo gerar algum tipo de discussão, aí sim, marca-se uma reunião para debater o tema.
Mesmo coisas que são mais legais de forma síncrona, como a apresentação de novos membros da equipe, não precisam de uma reunião exclusivamente marcada para isso. Pode-se esperar até um encontro realmente necessário e aproveitar os seus primeiros minutos para esse tipo de informação, bem como para reforçar informações já passadas de forma assíncrona.
A exceção aqui é para temas sensíveis, mesmo que não envolvam a necessidade de debate. O cara a cara é mais indicado para tais situações porque o tom de voz, a linguagem corporal e as nuances da comunicação verbal ajudam a humanizar o tema. Vale também para feedbacks, sejam em grupo ou individuais – positivos ou negativos, eles funcionam melhor no formato reunião do que num texto escrito.
Se mesmo assim ficar a dúvida sobre a necessidade de uma reunião, seja claro: pergunte a opinião da equipe e reforce que é OK dizer não aos convites caso haja uma boa alternativa.
Passo dois: como planejar uma reunião
Batido o martelo, é hora de planejar como será o encontro. Ter de separar tempo para pensar com antecedência cada compromisso parece assustador, mas não é nada demorado; basta rememorar alguns tópicos antes da reunião.
O primeiro: qual é o objetivo da reunião? Parece óbvio, mas não é. Em vez de elencar um alvo mais geral, como “discutir o projeto do cliente X”, pense em questões específicas que precisam ser decididas naquele momento: “Qual será o cronograma de execução? Quem fará o quê?”. E, mais importante, não deixe para bater o martelo depois: isso, além de criar uma bola de neve, passa a impressão de que a reunião foi inútil.
O segundo passo é delimitar o tempo da reunião. A enorme maioria aposta nos modelos tradicionais: 30 ou 60 minutos. Steven Rogelberg defende o modelo que ele chama de “25/50”: remover, na marra, cinco ou dez minutos. Essa medida simples teria alguns efeitos positivos, como obrigar todo mundo a ser mais sucinto e direto ao ponto nas conversas, além de abrir pequenos intervalos na agenda de todos, o que alivia o impacto de compromissos encavalados.
O terceiro ponto é delimitar quem estará na reunião. De novo, parece óbvio, mas não é. A ideia de que incluir mais pontos de vista para a discussão traz mais benefícios é limitada; muita gente junta pode causar um certo caos, debates inúteis ao propósito original da reunião e desgastes desnecessários.
A ciência mostra. Um estudo de 2011 analisou a performance de 97 equipes numa sequência de reuniões e tarefas distintas, e concluiu que os times maiores relataram experiências piores, incluindo mais agressões interpessoais.
Para evitar isso, só os agentes relevantes para a tomada de decisões devem estar presentes; os demais podem acompanhar de forma assíncrona, através de atas ou mensagens pós-reunião.
Para encontros longos, vale apostar em segmentar a discussão para que diferentes grupos possam participar apenas de pedaços delas. Ou seja, uma equipe responsável só por uma etapa de um projeto não precisa estar presente nas discussões sobre outras partes. Se for o caso de querer uma garantia de que todas as etapas estejam alinhadas, podem-se eleger representantes de cada time para acompanhar toda a reunião, liberando o restante desse fardo.
Por fim, quem vai conduzir a reunião deve estar preparado de alguma forma para estimular a colaboração – seja trazendo perguntas a serem feitas à equipe ou fontes de inspiração e exemplos (no caso de brainstorming). O objetivo aí é garantir que o encontro não vire um monólogo.
E, por fim, uma dica prática: tente compartilhar com antecedência qualquer material de apoio ou apresentação que será usado no momento da reunião. Isso evita a perda de tempo do processo de, já no encontro, ter de enviar arquivos e abrir links. Isso salvará minutos preciosos.
Passo três: como conduzir uma reunião
Apesar de tudo o que mostramos até agora, uma reunião não é uma receita de bolo, nem tem um manual de instruções rígido. Ela também é um momento de troca e interação espontânea da equipe. Se possível, comece o encontro alguns minutos antes, com pautas leves – conversa casual enquanto todos chegam e se ajeitam. Mas nada de extrapolar no tempo, é claro.
A fala inicial de quem conduz a reunião deve ser direta ao ponto: deixar claro a todos os presentes os objetivos daquele encontro – pode-se, inclusive, reforçar sobre as pautas que não fazem sentido naquele momento.
No caso das reuniões híbridas, a dificuldade é fazer com que os participantes à distância se sintam tão incluídos quanto a equipe reunida presencialmente. Não se trata de uma tarefa fácil. É importante, então, elencar uma pessoa – que não seja o líder – para ficar de olho na sala virtual (no chat, qualidade do som e áudio, quem quer falar etc.).
Passo quatro: faça o pós-reunião fazer sentido
A única maneira de combater o sentimento anti reunião numa empresa é essa: fazer os participantes sentirem que ela foi realmente necessária.
Para garantir isso, termine cada encontro com uma lista de encaminhamentos práticos: assinale missões específicas, prazos para entregas, datas para novos encontros etc. E, mais importante, não deixe isso morrer no stand-by. Acompanhar os desdobramentos do que foi discutido é essencial – não marcando outras reuniões, mas através de mensagens, e-mails. Dessa forma, confere-se importância ao que foi decidido.
Por fim, há dicas menos ortodoxas: eventualmente fazer reuniões com todos os participantes em pé, o que leva a encontros mais curtos; variar o local a cada reunião, incluindo ambientes externos e abertos, para não cair na mesmice; usar uma bolinha para definir quem está com a fala no momento; encontrar-se no metaverso… Fofo, mas o fato é que essas iniciativas “fora da caixa” têm impacto quase nulo. No fim, o que importa mesmo é o bom-senso. Será que um e-mail não resolveria?
Esqueça reunião de pé ou no metaverso. O que realmente importa é tornar os encontros mais enxutos.
1 – Filtre
Reuniões são ótimas porque são momentos de colaboração, debate e brainstorming. Tudo o que não precisar disso, então, pode ser feito de forma assíncrona: informes, tutoriais, socialização sem um objetivo claro (isso fica para os happy hours).
2 – 25/50
Em vez de apostar nos intervalos tradicionais (meia/ uma hora), tente tirar alguns minutos na marra já no convite. Isso induz todos a serem mais sucintos e diretos e ainda cria intervalos na agenda da empresa.
3 – Menos é mais
Chamar gente demais tende a prolongar as reuniões e desviar o foco do que importa. Pense na lista de convidados com carinho – só adicione quem realmente tem a contribuir. Os demais podem acompanhar as conclusões de forma assíncrona.
4 – Seja sucinto
Deixe claro para todos os objetivos práticos daquele encontro logo no início. E, no fim, tente sempre sair da sala com uma lista de encaminhamentos sólidos e decisões concretas – isso deixa claro, para todos, que aquela reunião foi útil e cumpriu seu objetivo.