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Alta demanda por Ozempic e Wegovy desequilibra economia da Dinamarca

Os medicamentos da Novo Nordisk impulsionaram o PIB do país no último ano e meio. Mas uma fatia grande na mão de só uma empresa cria um cenário perigoso.

Por Sofia Kercher
Atualizado em 6 set 2023, 08h03 - Publicado em 6 set 2023, 07h00
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 (Tamires Mazzo/Fotos: Getty Images/VOCÊ S/A)
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“Há algo de podre no reino da Dinamarca.” Se Hamlet fosse uma obra contemporânea, talvez Shakespeare usasse o trecho para fazer referência à semaglutida – princípio ativo do Ozempic e do Wegovy, remédios usados para emagrecer. Isso porque a alta demanda pelos medicamentos, especialmente nos Estados Unidos, está causando um desequilíbrio na economia do país escandinavo.

O valor de mercado da Novo Nordisk (N1VO34), fabricante dinamarquesa dos medicamentos, cresceu 30% este ano, chegando a US$ 419 bilhões (maior que o PIB da Dinamarca, de US$ 406 bilhões). O faturamento da companhia em 12 meses está em US$ 21 bilhões, o que equivale a 5% do PIB do país. As exportações do produto geraram um fluxo de dólares tão grande que a coroa dinamarquesa se valorizou, perdendo inclusive a paridade contra o euro, ao qual usualmente ela é fixada. Em resposta, o banco central do país manteve as taxas de juro abaixo das do Banco Central Europeu, numa tentativa de desvalorizar a moeda nacional.

Especialmente em países pequenos, ter uma empresa desempenhando um papel tão desproporcional na economia pode ser perigoso. Pegue a Finlândia, por exemplo. Em 2000, o faturamento da gigante de telecomunicações Nokia representava 4% de seu PIB (mais de 20% de suas exportações e 70% da bolsa de valores local). O valor de mercado da companhia chegou a ser duas vezes maior do que o PIB do país. O declínio da empresa coincidiu com a estagnação econômica da nação após 2008 — especialmente depois da ascensão do iPhone, lançado em 2007.

Todo o enrosco lembra um fenômeno chamado “Maldição do Petróleo”. A avalanche de dólares das exportações, em volume incompatível com o tamanho da economia, torna as importações ridiculamente baratas no país, fazendo com que a indústria local definhe. E mesmo com o PIB crescendo, mais gente fica sem emprego e não consegue surfar no bom momento do país. A desigualdade também tende a crescer.

No caso da Dinamarca, esse mau presságio já pode ser visto nos números. Segundo dados levantados pelo Sydbank, um banco dinamarquês, as farmacêuticas impulsionaram o PIB do país em quase dois pontos percentuais desde o final de 2021 até o 1º trimestre de 2023, cortesia da Novo Nordisk. O problema é que isso camuflou uma desaceleração de outros setores: se o PIB cresceu 1% durante o período, sem o setor farmacêutico, teria caído 1%.

Por enquanto, a Novo Nordisk está ditando o ritmo da música, e a Dinamarca dança de acordo com ela. Mas uma mera mudança na legislação dos EUA, ou a descoberta de um efeito colateral dos remédios (que começam a ser estudados com mais afinco), podem baquear a economia do país inteiro. Cabe às autoridades monetárias e ao governo entender como aproveitar as vantagens do fluxo de capital, sem acabar caindo na Maldição do Ozempic. É, Shakespeare. Ser ou não ser, eis a questão.

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