Conheça a Danke, marca brasileira que quer fazer chocolate como antigamente

Nascida em 2020, a Danke tem 132 anos de história. Seu CEO vem de uma das maiores famílias chocolateiras do país — e quer democratizar o chocolate premium.

Por Sofia Kercher | Design: Cristielle Luise | Fotos: Divulgação | Edição: Alexandre Versignassi
Atualizado em 9 nov 2023, 11h44 - Publicado em 11 out 2023, 06h00
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Ernesto faz parte da família Neugebauer, uma das primeiras fabricantes de chocolate do Brasil. (Danke/Divulgação)
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“Tenho uma memória de menino: morder o chocolate que era feito na fábrica do meu avô e deixá-lo derreter na boca.” Ao abrir uma barra de chocolates da Danke, marca fundada por Ernesto Neugebauer, essa é a primeira frase que aparece, estampada na parte de dentro da embalagem. E não se trata de papo para publicitário dormir: quando o assunto é chocolate, Ernesto tem cinco gerações de histórias para contar.

Apesar de a Danke só ter nascido em 2020, ela carrega mais de um século de história. Você pode ter reconhecido o sobrenome: Ernesto faz parte da família Neugebauer, fundadora da marca homônima, uma das primeiras fabricantes de chocolate do Brasil.

Desde 1891

A família de Ernesto é da Alemanha, e lá trabalhava com chocolates desde o começo do século 19. Em 1891, os Neugebauer migraram para o Brasil, e abriram uma fábrica dedicada ao produto em Porto Alegre.

A empresa cresceu para se tornar uma das maiores marcas do setor no Brasil. A partir dos anos 1960, a forte concorrência no varejo pressionou o negócio. Isso levou a família Neugebauer a vender a companhia para um grupo argentino, em 1982.

A Neugebauer pode ter sido vendida, mas o desejo de fazer chocolate não mudou. No mesmo ano, Ernesto e seus dois irmãos fundaram outra empresa, a Harald, focada em fornecer chocolate a grandes indústrias alimentícias. Ela chegou a ser uma das maiores fábricas do Brasil, com 72 mil toneladas de chocolates produzidos por ano. 

Em 2015, após o falecimento do irmão, sua irmã vendeu ambas as participações na empresa para o grupo japonês Fuji Oil. Ernesto permaneceu como sócio minoritário, mas começou a sentir que o negócio já não tinha o mesmo gosto.

Em 2018, ele vendeu sua participação, já com a intenção de montar um novo negócio. “No meu tempo de Harald, já comecei a comprar equipamentos de processamento do cacau que usamos hoje, na Danke”, explica. “Queria voltar a fazer chocolates como antigamente.”

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Vassoura de bruxa

Para entender de que “antigamente” Ernesto está falando, vale um pouco de contexto. O Brasil chegou a ser o maior produtor de cacau do mundo. Nos anos 1980, porém, veio uma epidemia de vassoura de bruxa, doença causada por um fungo que provoca deformação, apodrecimento e morte do fruto do cacau. A praga chegou a Ilhéus, no sul da Bahia, e devastou 68% das plantações de cacau do país. 

A produção caiu de 390 mil toneladas, em 1988, para 123 mil, em 2000. A partir daí, a importação de cacau se tornou necessária para atender ao consumo interno. De exportador, o Brasil passou para importador.

Segundo um levantamento da Statista, plataforma alemã de coleta de dados, hoje o Brasil produz 270 mil toneladas de cacau por ano, e está em 7º no ranking mundial de produção. Uma bela recuperação. Mas, de acordo com Ernesto, os problemas causados pela vassoura de bruxa ainda ecoam. 

“Pela questão econômica, o produtor se viu obrigado a simplificar muito sua operação”, diz. A indústria nacional afrouxou os parâmetros de seleção de frutos. O resultado foi uma perda de qualidade significativa, e a abertura para as importações, que se tornaram referência no mercado premium.

Mas o cacau é uma espécie nativa do Brasil, não da Suíça. De longa data, Ernesto vinha alimentando a ideia de fazer chocolate de primeira linha em parceria com pequenos produtores, a preço acessível, para competir com as marcas consolidadas do mercado.

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Início pandêmico

Desse desejo, nasceu a Danke. Significa “obrigado” em alemão, e é um agradecimento ao fruto do cacau – por ter sustentado cinco gerações de chocolateiros. Ernesto começou a montá-la no início de 2020.

Sim, justamente 2020, sob as turbulências e desafios da pandemia. “Nosso equipamento era da Suíça. Além de a fornecedora ter atrasado 6 meses na entrega, os suíços que vieram montar o maquinário ficaram com receio de não conseguirem voltar para casa.”

Nesse cenário, a fábrica manteve as portas fechadas até dezembro de 2020. Mas quando abriu já chegou chegando: naquele mesmo mês, a marca Danke já estava nas principais redes de supermercado do país. 

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Uma barra de chocolate da Danke custa, em média, R$ 17. (Danke/Divulgação)

A alma do chocolate

O diferencial da Danke, segundo Ernesto, é o cacau. Mais especificamente, a relação com o parceiro agrícola que o produz.

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“Fazer chocolate não tem muito segredo. As fábricas são muito parecidas entre elas, o processo é similar. O que a gente faz de diferente é muito mais mérito do nosso parceiro agrícola do que nosso. O cacau é a alma do chocolate”, diz Neugebauer.

O cacau utilizado pela empresa é Fino e de Aroma – reconhecido pela Organização Internacional do Cacau (ICCO) como um fruto de qualidade.

O que fazemos de diferente é mérito dos nossos parceiros agrícolas. O cacau é a alma do chocolate.

Ernesto Neugebauer

A produção é artesanal, mas segue critérios rigorosos. Primeiro, os frutos são colhidos sempre maduros. Depois, o cacau descansa no chão de um a dois dias, o que ajuda na concentração de açúcar na polpa da amêndoa, que é importante na etapa seguinte: a fermentação. Nesse processo, que dura de cinco a sete dias, bactérias convertem parte dos açúcares em ácidos. 

Em seguida, entra a fase mais demorada: a secagem e a maturação. Durante o dia, as amêndoas secam ao sol; à noite, umedecem. Isso gradativamente tira a acidez, e confere notas aromáticas.

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A Danke compra sua matéria-prima diretamente dos produtores, sem intermediários. É o chamado bean to bar (da amêndoa à barra). No início, eram cinco parceiros. Hoje, são mais de 50 – mas não é simples seguir crescendo de forma acelerada nesse tipo de negócio. “Isso não se expande de maneira rápida, porque nem todo mundo está capacitado tecnicamente a produzir esse cacau”, explica.

Em 2022, os brasileiros consumiram 336 mil toneladas de chocolate. Diante desse universo, a produção da Danke é pequena – 1,4 mil toneladas, na forma  de um portfólio de 22 produtos. Tal qual com os parceiros agrícolas, a ideia é expandir devagar e sempre, prezando pela manutenção da qualidade.

A fábrica onde a matéria-prima se transforma em barras fica em Cajamar, interior de São Paulo. A Você S/A visitou. Quem nos recebeu foi a filha de Ernesto, Carol Neugebauer. Ela tem uma marca própria de produtos artesanais, a Noir Chocolates. Os escritórios e produção da Noir e da Danke são integrados. “Quase tudo que eu sei sobre chocolate eu aprendi com meu pai. Apesar de serem negócios separados, ele é meu mentor, me ajuda a fazer novos produtos”, conta.

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A marca tem um portfólio de 22 produtos — e planeja expandir ainda em 2023. (Danke/Divulgação)

No horizonte

Desde que surgiu, a Danke dobra de tamanho ano após ano. Para 2023, preveem um faturamento de R$ 48 milhões. Mas não é simples manter esse ritmo. “O caminho tem sido mais difícil do que antecipamos”, diz Ernesto. 

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“Fazer marca é muito complicado no Brasil. Temos a concorrência com as importadas e com as tradicionais daqui. É um mercado muito consolidado, competitivo”, explica. Para 2024, de qualquer forma, a expectativa é a de que o faturamento cresça para algo entre  R$ 68 milhões a R$ 78 milhões.

Para garantir uma expansão sólida, a empresa está construindo outra fábrica em Tatuí, também no interior de São Paulo. No Nordeste do país, a Danke possui duas estações experimentais, onde testa opções diferentes de cacau para ampliar o portfólio. 

O sonho da família Neugebauer, no fim das contas, é reintroduzir a cultura do chocolate de primeira linha feito no Brasil. Ernesto brinca: “Chega de trazer a mala empacotada de chocolate das férias.” 

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