BC corta juros pela 1ª vez em 3 anos e Selic cai 0,5 p.p. para 13,25%
Criticado por Lula, Campos Neto votou pelo corte maior que os 0,25 p.p. esperados. A decisão foi acirrada, 5x4, e a primeira divergência no Copom desde setembro de 2022.
Caiu. Primeiro foi a pressão pesada do governo, com Lula chamando o presidente do BC, Roberto Campos Neto, de “esse cidadão”. Depois veio a indústria e o comércio reclamando do crédito caro e das vendas abaixo do esperado, com Luiza Trajano, do Magalu, pedindo publicamente para que o presidente do Banco Central baixasse os juros. Por fim, até a Faria Lima, que se dá bem com juros altos, se juntou ao coro pela queda da Selic.
O BC ouviu e nesta quarta, depois de 12 meses de Selic a 13,75% ao ano, o Copom baixou em 0,5 ponto percentual a taxa básica de juros do Brasil, para 13,25% ao ano.
As surpresas foram muitas. Primeiro: a magnitude da redução não era consenso. A decisão tomada estava nas apostas de 40% do mercado, segundo levantamento do jornal Valor Econômico junto a 112 ouvidos – 58% esperavam um Copom mais comedido, com um corte de 0,25 pp.
Segundo: o placar. A última vez que houve divergência no Copom foi em setembro de 2022. E, dessa vez, a decisão foi apertada (5 x 4). Como esperado, Gabriel Galípolo e Ailton de Aquino Santos, indicados por Lula, votaram a favor do corte de 0,5 ponto percentual. A surpresa foi que Campos Neto se juntou ao coro.
Terceiro: o Copom indicou que os próximos cortes devem ser da mesma magnitude, 0,50 p.p. Considerando que o comitê se reúne mais três vezes neste ano, a Selic cairia para os 11,75% ao ano, abaixo dos 12% esperados pelo mercado.
“O Copom avaliou a alternativa de reduzir a taxa básica de juros para 13,50%, mas considerou ser apropriado adotar ritmo de queda de 0,50 ponto percentual nesta reunião em função da melhora do quadro inflacionário”, diz o Comitê em comunicado sobre a decisão.
Esse é o primeiro corte de juros desde a pandemia. A última vez que o BC havia reduzido a Selic foi em agosto de 2020, para 2%, a menor da história.
Desde então, a inflação disparou e, em resposta, o Copom elevou os juros para o maior nível em seis anos e meio para conter a alta de preços. Deu certo: de 10,06% no acumulado de 2021, o IPCA caiu para 5,79% em 2022 e soma 3,16% nos últimos 12 meses encerrados em junho, dentro da meta de 3,25% do BC para este ano (com tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos).
“O conjunto dos indicadores mais recentes de atividade econômica segue consistente com um cenário de desaceleração da economia nos próximos trimestres”, reconheceu o BC, mas sem deixar de alertar para a previsão de uma alta na inflação no segundo semestre. Considerando a projeção de 4% para o IPCA nos próximos 12 meses, o nosso juro real ainda é o maior do mundo, aos 9,25%. O do México, que vem em segundo lugar, está em 6,64%.
Mundo afora, os preços também cederam com políticas monetárias restritivas e a normalização da cadeia de suprimentos. Nos EUA, a inflação desacelerou de 9% para 3% e na zona do euro foi de 10,6% para 5,3%.
Não só o maior inimigo do BC deu trégua, mas o cenário macroeconômico brasileiro como um todo melhorou. O real se valorizou, o novo arcabouço fiscal e a reforma tributária caminham no Congresso, o PIB do primeiro trimestre veio acima das expectativas, e a agência de rating Fitch melhorou a nossa avaliação de crédito. Tudo isso fez com que as previsões melhorassem, com expectativa de uma inflação ainda menor, o que abriu caminho para o ciclo de cortes de juros que se iniciou hoje.
Fitch pra lá e pra cá
Enquanto a Fitch melhorou a nota de crédito do Brasil, ela piorou a dos Estados Unidos. Ontem, a agência de classificação de risco reduziu de AAA para AA+ a avaliação da dívida do Tesouro americano, em tese, o investimento mais seguro do mundo.
Por lá, a dívida do governo soma US$ 32 trilhões, mais que 100% do PIB, que somou US$ 25,5 trilhões ano passado. E não há perspectiva que ela pare por aí. Sempre o que “teto de gastos” dos yankees é ultrapassado, Washington simplesmente aumenta o teto, sem um plano fiscal para cortar gastos e aumentar a arrecadação, como estamos fazendo no Brasil.
Mesmo com esse cenário fiscal catastrófico, o rebaixamento foi uma surpresa. Especialmente porque a economia americana está mais forte do que o esperado e, talvez, uma recessão não dê as caras, como projetado no começo do ano. Neste ponto, a Fitch vai contra o mercado e espera uma recessão ainda este ano, sem pouso suave após o ciclo de alta de juros por lá.
E esse ciclo pode estar um pouco menos perto do fim. Hoje, o relatório ADP de criação de empregos no setor privado de julho veio bem acima do esperado, com 324 mil contratações, ante previsão de 183 mil, o que deixou investidores em dúvida sobre a manutenção dos juros em 5,5% pelo resto do ano.
As surpresas negativas abalaram Wall Street e o S&P 500 teve sua maior queda diária desde maio, com recuo de 1,38%. O petróleo também foi atingido, com desvalorização de 2%.
O Ibovespa também foi contaminado pela aversão a risco e cedeu 0,32%.
No pregão, o destaque ficou com a Cielo (CIEL3), que despencou 9,15%. A empresa de pagamentos teve um lucro de R$ 486 milhões no segundo trimestre, número 26,8% maior na comparação com o mesmo período de 2022, e dentro do esperado pela Faria Lima. O problema está no volume financeiro transacionado, que caiu 11,4% ante o ano passado, mais do que o previsto. Ou seja, a Cielo perdeu mais clientes do que o mercado calculava.
Bom, não é sempre que o mercado acerta. Resta saber se amanhã os investidores verão o copo meio cheio ou meio vazio após essa decisão do BC.
Até lá 😉
MAIORES ALTAS
Cogna (COGN3): 3,13%
JBS (JBSS3): 2,52%
Cyrela (CYRE3): 2,47%
Lojas Renner (LREN3): 1,88%
Grupo Pão de Açúcar (PCAR3): 1,67%
MAIORES BAIXAS
Cielo (CIEL3): -9,15%
Locaweb (LWSA3): -5,13%
CSN (CSNA3): -2,92%
Magazine Luiza (MGLU3): -2,92%
Carrefour (CRFB3): -2,35%
Ibovespa: -0,32%, aos 120.859 pontos
Em Nova York
S&P 500: -1,38%, aos 4.513 pontos
Nasdaq: -2,17%, aos 13.973 pontos
Dow Jones: -0,98%, aos 35.283 pontos
Dólar: 0,33%, a R$ 4,8055
Petróleo
Brent: -2,01%, a US$ 83,20
WTI: -2,31%, a US$ 79,49
Minério de ferro: -1,07%, a US$ 115,74 por tonelada na bolsa de Dalian (China)