CEO da Blau Farmacêutica comenta os planos de expansão para o varejo

Especializada na produção de medicamentos de alta complexidade para hospitais, a companhia quer ampliar sua presença nas farmácias, e está construindo uma fábrica de R$ 1 bi para otimizar a produção. O presidente e fundador Marcelo Hahn dá os detalhes.

Por Júlia Moura | Fotos: divulgação | Design: Caroline Aranha
Atualizado em 6 fev 2023, 07h34 - Publicado em 13 jan 2023, 05h54
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 (Blau Farmacêutica/Divulgação)
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Apesar de ter apenas 35 anos, a história da Blau (BLAU3) começa antes da Segunda Guerra Mundial, quando o farmacêutico Adolfo Klinge montou uma fábrica de medicamentos em Berlim. Sua filha se casou com um químico, Alfredo Hahn, e manteve o negócio em família. No pós-guerra, o casal se mudou para a Argentina e abriu a própria farmacêutica em solo latino. Aos poucos, expandiu o negócio pela América do Sul. 

Após a morte de Alfredo, descobriu-se que ele tinha vários herdeiros de diferentes relacionamentos e a indústria, então, se desmembrou. Seu filho Rodolfo Hahn ficou com a parte brasileira, a Ariston.

Em 2005, com dificuldades financeiras, Rodolfo se viu obrigado a se desfazer do negócio da família. Formado em farmácia, seu filho Marcelo Rodolfo Hahn não só recobrou a indústria do pai poucos anos depois como reconstrói o império de seu avô por meio da Blau, que exporta fármacos para diversos países.

Com foco em medicamentos complexos, feitos para hospitais e clínicas, a Blau (BLAU3) produz antibióticos, antirretrovirais, remédios oncológicos e anestésicos (entre outros) – também fabrica a camisinha Preserv, produto inicial da marca. Hoje, são mais de 8 mil clientes, em um mercado estimado em mais de R$ 7 bilhões. 

No Brasil, a companhia tem 27% do mercado no qual está inserida. Estreou na bolsa em 2021, ano que fechou com lucro de R$ 324 milhões. No terceiro trimestre de 2022, lucrou R$ 93,9 milhões, com margem líquida de 26%.

Aqui, Hahn conta como construiu uma companhia com valor de mercado de R$ 4,8 bilhões vendendo o seu carro aos 19 anos e recuperando o legado de família. E mostra os planos de expansão da Blau.

Como surgiu a Blau? 

Eu visitava o laboratório do meu pai desde pequeno. Naquela época não existiam as restrições e cuidados que temos hoje para entrar dentro de uma área fabril. As visitas acabaram virando trabalho quando eu era adolescente. E essa experiência foi mais que um excelente aprendizado, ela me despertou o sonho de um dia ter minha própria indústria farmacêutica. 

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Fui cursar farmácia nos Estados Unidos, enquanto meu irmão mais velho abria um negócio próprio que prosperou muito. Isso despertou ainda mais a vontade de ter minha própria empresa no Brasil. Logo que voltei ao país, comecei a estudar o que poderia ser um bom negócio ligado à indústria farmacêutica.

Pensei em importar IFA (ingrediente farmacêutico ativo), mas para isso era preciso muito dinheiro – eu precisaria ter um estoque com vários IFAs para atender a indústria brasileira. E não contei com a ajuda do meu pai, porque ele queria que eu trabalhasse com ele. 

Então, continuei pesquisando. Naquele momento estava tendo uma onda de Aids no mundo e aqui no Brasil só havia um fabricante de preservativos com várias marcas. Foi aí que pensei em importar preservativos. Aos 19 anos, vendi meu carro e investi nessa ideia. 

Como as marcas de camisinha da época tinham uma linguagem que beirava o pornográfico, escolhi vender o meu em uma caixa branca com uma maçã vermelha. Foi aí que nasceu a Preserv, em 1987. Comecei importando da Alemanha. E depois, com o crescimento das vendas, comprava da Malásia e da Tailândia.

Eu mesmo visitava os clientes e realizava as vendas. Como o mercado era carente, foi muito fácil a inserção da Preserv. Vendíamos até em supermercados embalagens com 12 unidades. Via-se muita mãe comprando para o filho, dada a quantidade de artistas famosos contaminados. 

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A operação cresceu tanto que, quatro anos depois da abertura da companhia, eu já conseguia importar medicamentos. E assim a Blau foi se desenvolvendo. Hoje, a Preserv responde por menos de 1% da nossa receita.

Por que a decisão de construir fábricas próprias no Brasil?

O país tinha muitos problemas econômicos, sempre com desvalorização da moeda. Então, você remava, remava, remava e perdia muito dinheiro com essas mudanças cambiais. Foi aí que decidi montar uma indústria. A nossa primeira fábrica foi inaugurada em 1995, em Caucaia do Alto (SP), voltada para a produção de medicamentos oncológicos.

Logo depois, em 1999, foi criada a Anvisa, o que nos favoreceu bastante porque nossas instalações já respeitavam as normas que seriam implementadas. Essa planta é dedicada exclusivamente para produtos oncológicos, mas, naquela época, muitos laboratórios foram obrigados a parar de fabricar tais medicamentos para evitar a contaminação cruzada com outras produções. Você não pode manipular um produto oncológico junto com um produto que não é oncológico por conta dos residuais. 

Já em 2005 inauguramos nossa segunda fábrica, em Cotia (SP), dedicada a produtos biológicos, a primeira no Brasil.

E a fábrica que era de seu pai? Por que comprá-la de volta? 

Desde que comecei a Blau, sempre tive uma política de não concorrer com o laboratório do meu pai. Nunca vendi os produtos que ele vendia. Mas ele acabou tendo dificuldades com essa mudanças regulatórias e com a fraca economia do país no fim dos anos 1990, então vendeu a fábrica de antibióticos para terceiros em 2005. Em 2013, conseguimos recuperá-la para aumentar nosso portfólio com antibióticos. 

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Também compramos um laboratório em Anápolis (GO) e, agora, mais recentemente outro em São Paulo. 

Ainda expandimos as unidades antigas e, na de Cotia, passamos a produzir IFA. Investimos nisso desde os anos 2000 e, em 2021, finalmente inauguramos a planta. Foi um sonho realizado.

Como o nosso carro-chefe é a nefrologia [medicamentos que tratam doenças do sistema urinário], produzimos IFA para a fabricação desses fármacos. Somos líderes nesse mercado no Brasil, com cerca de 95% da fabricação de alfaepoetina [remédio que estimula a produção de células vermelhas do sangue, usado por pacientes em hemodiálise].

Agora, estamos produzindo quatro proteínas para ingressar no mercado de anticorpos monoclonais [utilizados para o tratamento de câncer, entre outras funções]. Somos precursores desse desenvolvimento.

E como está a expansão da Blau fora do Brasil? 

Nos últimos dez anos, investimos bastante na expansão geográfica. Compramos nossos distribuidores 

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na Colômbia, no Uruguai, no Chile, na Argentina, no Peru e no Equador. Também exportamos para Costa Rica, Panamá, Tailândia, Vietnã e Emirados Árabes. Hoje, nós temos mais registros de medicamentos da Blau fora do Brasil do que no Brasil.

Nosso próximo desafio é o México. Queremos ingressar ali para depois ir para o mercado americano. 

Nos EUA, já temos uma operação de coleta de plasma – algo que não é regulado no Brasil. Precisamos de plasma para produzir medicamentos como a imunoglobulina, que foi muito utilizada na pandemia contra a Covid-19. 

Passamos a fazer a coleta recentemente para garantirmos a qualidade do produto – e para que ele não nos falte.

Nos EUA, paga-se em média US$ 75 por coleta. E, diferentemente da doação de sangue, que só pode ser feita duas vezes ao ano, a de plasma pode ser feita duas vezes por semana. Acaba sendo um bom complemento de renda. Mas aqui no Brasil isso é proibido.

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Já estamos abrindo nosso segundo centro de coleta nos EUA e montando o terceiro. A ideia é termos dez por lá, o que vai nos dar a independência em relação a esse insumo. Também estamos investindo no aumento de capacidade produtiva nas nossas plantas atuais e no projeto de Pernambuco.

O que é este projeto?

A ideia é produzir todos os nossos medicamentos lá em grande escala e com baixo custo operacional e exportar para o mundo todo. A fábrica está muito bem localizada [no Complexo de Suape], a cinco quilômetros do aeroporto e do porto.

Vamos dar início à obra agora no primeiro semestre de 2023, a um custo de construção de R$ 1 bilhão. Ela deve iniciar a produção em 2024.

Como lá temos benefício da Sudene, ou seja, redução de impostos, este é um investimento que se paga. Além de um desconto no ICMS, temos uma redução de 85% no Imposto de Renda. 

Hoje, temos cinco fábricas em cinco endereços diferentes. A ideia é produzir tudo em um lugar só, com alta capacidade e baixo custo operacional, de modo que nos permita expandir nossa linha de medicamentos. 

O plano é transferir todas as produções para Pernambuco, menos a do IFA, que requer muita pesquisa e inovação – e é difícil levar tantos pesquisadores para lá.

E queremos ampliar nossa presença no mercado. Estamos muito focados em hospitais, que recebem 95% do que fabricamos, então vamos começar a produzir mais medicamentos para o varejo, com remédios de prescrição.

Quais os planos para o varejo? 

Estamos investindo na serialização dos medicamentos. Ou seja, o remédio vai ser produzido com um número de série e será possível vendê-lo por unidade, e não apenas em uma caixa com dez, trinta comprimidos. 

Também desenvolvemos embalagens unitárias que podem ser preenchidas de acordo com a necessidade exata do paciente. Sem ele ter de comprar mais ou menos do que precisa. É algo que já existe nos EUA e que a Anvisa deve liberar por aqui.

Além do seu pai, que preside o conselho da Blau, existe mais alguém da família na companhia? Há um plano de sucessão?

O meu segundo filho se formou na Inglaterra, veio para a Blau, fez dois anos de trainee e agora está cuidando de uma de nossas unidades. Temos um plano sucessório dentro da organização, mas vai depender dele. Ele terá que conquistar o seu espaço. Sempre deixei claro para os meus filhos que se eles quisessem trabalhar aqui teriam que ter o melhor currículo de todos para não serem chamados de filhinho de papai. 

Tenho muito cuidado porque sempre penso a companhia em primeiro lugar e me preocupo com sua perpetuidade. É como se a empresa fosse meu primogênito. E olha que sou pai de cinco filhos. Tenho muito amor pelo negócio e não gostaria de ver isso aqui perdido, como já aconteceu na minha família. E essa foi uma das grandes motivações para abrirmos o capital. 

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(Blau Farmacêutica/Divulgação)
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