Ibovespa cai 2,31% na semana da decepção com o Fed

A perspectiva de juros elevados por anos a fio nos EUA derrubou as bolsas globais e pressionou (ainda mais) as varejistas da B3: BHIA3 -8%; MGLU3 -4,68%.

Por Camila Barros, Jasmine Olga
Atualizado em 22 set 2023, 18h40 - Publicado em 22 set 2023, 18h13
-
 (Cristielle Luise/Fotos: Getty Images/VOCÊ S/A)
Continua após publicidade

Tem uma música do Tame Impala que diz: quando o assunto são relacionamentos amorosos, “the less I know, the better”. Assim dá pra se esquivar de decepções. Para o mercado financeiro, a máxima é o oposto disso: quanto mais se sabe, melhor, claro. Dessa forma, investidores conseguem calibrar suas expectativas – palavra-chave no dia a dia do mercado – e evitar surpresas. 

O que rolou nesta semana foi isso: depois de o Fed sinalizar que os juros americanos devem seguir em alta por mais um bom tempo, os investidores precisaram remanejar suas apostas em renda fixa e variável. O resultado foi uma queda acumulada de 2,82% no S&P 500 esta semana; na Nasdaq, -3,35%. Já os títulos públicos americanos valorizaram e o dólar também. Na semana, a moeda americana teve alta de 1,26% em relação ao real.

Na quarta, Jerome Powell, presidente do Fed, disse que a instituição continua “fortemente empenhada em reduzir a inflação para o nosso objetivo de 2%”. Os membros do Fomc acreditam que essa meta só será alcançada em 2026. Até lá, os juros seguem altos para os parâmetros americanos: as medianas das projeções dos dirigentes do BC americano são de 5,6% ao final de 2023, 5,1% no fim de 2024 e 3,9% em 2025 – muito, tendo em vista que o ideal num cenário de inflação controlada, para os membros do Fed, seria 2,5%. 

Hoje, a presidente do Fed de São Francisco, Mary Daly, disse que a instituição ainda não tem certeza de qual será o próximo passo, nem se deve mesmo rolar um último aumento de 0,25 pp até o fim do ano. “Paciência é uma estratégia prudente”, disse. Diretora do Fed, Michelle Bowman, disse considerar apropriado subir mais os juros e mantê-los apertados por mais tempo.

Má notícia para os ativos de renda variável, que perdem atratividade quando os títulos públicos têm uma rentabilidade alta. Ruim também para as commodities, que sentem o peso de uma possível desaceleração na economia mundial: com juros altos nos EUA por mais tempo, o crédito se mantém caro. Com isso, a economia pode retrair e a demanda por matéria-prima, diminuir. Isso explica a queda de 3,8% na cotação do minério ontem. 

Hoje, a commodity voltou para o território de alta: 0,87% na bolsa de Dalian. Já o Brent permaneceu estável, a 0,03%. Cortesia da China, que anunciou mais uma medida para tentar estimular seu crescimento econômico. A nova política flexibiliza as regras para o investimento de estrangeiros em Xangai e Pequim. 

Continua após a publicidade

O resultado deu espaço para as gigantes da bolsa se recuperarem das quedas: VALE3 subiu 0,74% (depois de cair 2,61% ontem); PETR4 ganhou 0,80% (contra queda de 1,55% ontem). 

Já o Ibovespa ficou -0,12% hoje, e terminou a semana com uma perda acumulada de -2,31%. Por aqui, na quarta, o Copom cortou as asinhas de quem apostava numa queda mais acentuada, de 0,75pp, na Selic durante as próximas reuniões. O comitê apontou a alta do petróleo lá fora (que já subiu quase 30% desde junho) e a posição hawkish do Fed como impeditivos para cortes maiores. 

Aí instaurou-se um mau humor similar ao do exterior. E ele permaneceu: das 86 ações que compõem o índice, 60 fecharam em queda neste pregão. 

BHIA3 (-8,11%), MGLU3 (-4,68%) e CRFB3 (2,81%)

A Super Quarta mexeu com as bolsas, com a curva de juros e também com as estimativas do mercado para os setores mais sensíveis às idas e vindas da política monetária global. Na B3, as varejistas foram algumas das ações que mais sentiram o impacto negativo das palavras de Powell e cia. 

Continua após a publicidade

É que os juros altos por mais tempo lá fora e a sinalização de que a Selic não deve acelerar o seu ritmo de queda nos próximos meses significam que a tomada de crédito deve continuar cara por aqui, reduzindo o ímpeto de consumo das famílias brasileiras e pressionando o caixa de empresas que possuem um nível de endividamento mais elevado. 

Nesta sexta, essa perspectiva ruim refletiu-se em queda nos papéis do varejo, com -8,11% para o Grupo Casas Bahia e e -4,68% para o Magazine Luiza.

No caso de BHIA3, a projeção de juros mais altos está longe de ser a única razão para o tombo de hoje. Nas últimas duas semanas, temos falado bastante da companhia por aqui. É que as mudanças recentes feitas pela gestão (e também as pretendidas para o futuro) geram incerteza e desconfiança no mercado. 

A piora nas perspectivas futuras para o setor acaba ficando apenas como a cereja do amargo bolo. Na semana passada, o Grupo Casas Bahia fez uma oferta de ações que levantou menos dinheiro do que o esperado. Com o fechamento de hoje em R$ 0,68, a companhia já acumula uma queda de 41,8% desde os R$ 1,17 do dia do anúncio da operação.

Enquanto a maior parte das varejistas derrapam, rolou um destaque positivo hoje: as ações do Carrefour (CRFB3) finalizaram o dia com alta de 2,81%. 

Continua após a publicidade

Uma das razões pode ser puramente técnica: em outras palavras, teria subido porque caiu demais. Os papéis da companhia acumulam perdas superiores a 35% no ano e boa parte dessa queda ocorreu nos últimos 30 dias — mesmo com os ganhos de hoje, CRFB3 ainda registrou um recuo de 8,13% na semana. Mas também há o momento adverso vivido pelo concorrente Pão de Açúcar (PCAR3), que caiu bem mais: 19% na semana. Isso favorece uma migração de investidores que (ainda) querem exposição ao varejo alimentar para os papéis do Carrefour. 

Recapitulando: o GPA realizou no último mês a cisão do seu braço varejista na Colômbia (o Grupo Éxito) e mostrou interesse na venda de sua fatia de 34% na empresa de e-commerce Cnova, mas a complexa estrutura societária da companhia segue… complexa. Isso sem falar no seu controlador francês Casino, que mais uma vez reduziu as suas metas de receita para os próximos quatro anos, em um momento em que ainda enfrenta um alto endividamento. Para os analistas, a necessidade de levantar caixa por parte da empresa-mãe pode levar a decisões precipitadas no que diz respeito à venda de ativos e estratégias — uma má notícia para o acionista minoritário. 

BRKM5 (-3,29%) 

Os últimos dias foram um balde de água fria para os investidores confiantes que a Braskem iria enfim “desencantar” e conseguir um comprador para a fatia de sua controladora Novonor (ex-Odebrecht) — o resultado é uma queda de 3,29% nesta sexta-feira e de 6,6% na semana. 

O fracasso nas negociações entre Novonor (dona de 50,1% da petroquímica), Petrobras (que detém 47%) e um eventual comprador pode até parecer um capítulo do Vale a Pena Ver de Novo, mas se trata de um desdobramento inédito. 

Continua após a publicidade

Negociações para a venda da parte da Novonor ocorrem desde 2019 e, até agora, sempre acabam esbarrando em alguma dificuldade. Normalmente a pedra no sapato tem sido uma discordância entre controladores, compradores e os credores da empreiteira, que detém 38% do capital da Braskem como forma de garantia. 

Em 2023, a corrida pela Braskem voltou a aquecer e a companhia recebeu três ofertas — uma da J&F, holding dos irmãos Joesley e Wesley Batista, uma da Unipar e uma oferta conjunta feita pela Adnoc (a petrolífera estatal dos Emirados Árabes Unidos) e o fundo Apollo Global. 

A proposta que desandou nos últimos dias foi esta última. De acordo com rumores que circularam pelo mercado, o Apollo teria desistido da parceria com a Adnoc ao encontrar resistência por parte da Petrobras — ainda que a estatal já tenha admitido que enxerga com bons olhos a chegada de um parceiro estratégico. 

Até agora, não houve declaração oficial das partes envolvidas, mas a falta de perspectiva para que o negócio realmente saia acabou azedando também a recomendação de alguns bancos de investimentos para os papéis. E isso consolidou a Braskem como um dos destaques negativos dos últimos pregões. Agora, é aguardar as cenas dos próximos capítulos.

Bom fim de semana.

Continua após a publicidade
Compartilhe essa matéria via:

 

 

MAIORES ALTAS

BRF (BRFS3): 3,21%

Carrefour (CRFB3): 2,81%

Raia Drogasil (RADL3): 2,12%

IRB (IRBR3): 1,96%

CSN Mineração (CMIN3): 1,30%

MAIORES BAIXAS

Casa Bahia (BHIA3): -8,11%

Magazine Luiza (MGLU3): -4,68%

Vamos (VAMO3): -3,96%

Gol (GOLL4): -3,89%

Braskem (BRKM5): -3,29%

 

Ibovespa: -0,12%, aos 116.008 pontos. Na semana, -2,31%. 

 

Em Nova York

S&P 500: -0,23%, a 4.319 pontos

Nasdaq: -0,09%, a 13.211 pontos

Dow Jones:- 0,31%, a 33.964 pontos

 

Dólar: -0,05%, a R$ 4,93. Na semana, moeda +1,26%

 

Petróleo

Brent: 0,03%, a US$ 93,27 por barril. Na semana, -0,67%. 

WTI: 0,45%, a US$ 90,03 por barril. Na semana, +0,01%. 

 

Minério de ferro: 0,87%, a US$ 119,33 a tonelada na bolsa de Dalian (China).

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 6,00/mês*

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$118,80, equivalente a 9,90/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.