Oi (OIBR3) se aproxima do fim da recuperação judicial: vale a pena investir?

Entenda quais são as incertezas que pairam sobre a companhia, que fez parte da primeira geração de "meme stocks" da bolsa brasileira.

Por Tássia Kastner
Atualizado em 24 ago 2022, 11h53 - Publicado em 12 ago 2022, 06h19
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 (Paulo Fridman/Getty Images)
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A Oi (OIBR3) fez parte da primeira geração de meme stocks brasileiras, as ações que capturam a atenção do investidor pessoa física e viram samba de nota só nas redes sociais. Ela tinha o perfil: uma empresa em recuperação judicial, mas grande demais para quebrar e negociada a centavos, perfeito para gerar altas e baixas bruscas (e assunto) todo pregão. Estávamos em 2019, quando a bolsa brasileira cruzou a marca de 1 milhão de investidores. 1 milhão de pessoas sedentas por investir em ações, mas boa parte sem ter a mais vaga ideia de por onde começar.

Em outubro daquele ano, o Traders Club (hoje uma empresa com ações na B3) organizou um evento que levava para o mundo real as mesmas discussões (nem sempre profundas) sobre ideias de investimentos que ocorriam na internet. Era uma tarde de sábado, e coisa de 400 pessoas estavam reunidas num salão perto da avenida Juscelino Kubitschek, centro financeiro de São Paulo. Um dos assuntos era a Oi. Lá pelas tantas, alguém pergunta: “Quem tem ações da Oi aqui?”. Uma parcela considerável da plateia levanta a mão. “E quem tem celular da Oi?” Umas quatro pessoas se manifestaram.

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Foi uma tentativa de provar por que as ações da telefônica eram uma cilada. Um gestor de fundo, então, trucou com uma longa explicação que poderia ser resumida assim: “A Oi não é apenas uma empresa de telefonia, mas a espinha dorsal do tráfego de dados do país”.

Ali, a empresa já contava três anos de processo de recuperação judicial. Quando pediu proteção à Justiça, em junho de 2016, ela listou R$ 65 bilhões em dívidas, o que faz dessa RJ a maior do país (a Odebrecht tinha mais dívidas quando fez o mesmo, mas nem todas entraram no processo). O rombo foi resultado da má gestão após a privatização da telefonia no país, enquanto o governo incentivava a criação de uma supertele com base nos juros de pai para filho do BNDES.

Até 2019, a recuperação estava empacada. Foi quando Rodrigo Abreu, CEO da companhia ainda hoje, assumiu o timão do barco. O executivo começou praticamente do zero um plano para vender ativos, quitar dívidas, colocar dinheiro no caixa da companhia e fazer com que ela voltasse a ser viável financeiramente. É quando realmente começa a recuperação judicial da Oi. Antes disso, quem falava de comprar ações estava apostando em uma retomada que dificilmente viria.

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(NurPhoto/Getty Images)
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Mais três anos se passaram, e a estratégia deu certo. A Oi caminha para concluir sua recuperação judicial em breve, agora como uma empresa menor, focada principalmente em serviços de fibra óptica.

A pergunta feita à plateia para explicar a “tese de investimento” em Oi deixaria de fazer sentido. A Oi Móvel foi vendida de maneira fatiada para Vivo, Claro e TIM, as três grandes concorrentes do setor, num negócio concluído em 2022. O que não mudou foi uma dúvida: afinal, vale a pena ter ações da Oi?

Liquida

Não é só pelo meme que a Oi suscita tanto debate. A companhia tem 1,4 milhão de acionistas. É a segunda maior da bolsa inteira, atrás apenas da concorrente Vivo e seu 1,5 milhão de investidores. As teles têm acionistas legados da época das privatizações, em 1998. A história vem da época em que, ao comprar uma linha de telefone fixo (alerta de velhice ligado), você se tornava acionista das estatais de telecomunicações.

Mas o fato é que o processo de RJ atraiu gente tentando surfar quando a recuperação fosse encerrada. Virou quase uma miragem. Parece cada vez mais perto, só que o fim nunca chega. Rodrigo Abreu avisou, lá atrás, que tinha um plano – mas que ele iria demorar.

Era complexo, afinal. A Oi vendeu grupos de ativos: as torres de celulares (que colocaram R$ 1 bilhão no caixa), data centers (R$ 325 milhões), operação de telefonia móvel (R$ 15,9 bilhões) e a TV por assinatura via satélite (R$ 786 milhões – ainda à espera de aval dos órgãos reguladores).

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Isso sem falar em negociações mais pulverizadas, ainda que vultosas. No dia 1º de agosto, a companhia firmou um contrato para vender por R$ 1 bilhão unidades ligadas à infraestrutura de telefonia fixa da empresa.

A joia da coroa, porém, é outra: a operação de fibra óptica.

Vão-se os anéis

A parte mais ousada da RJ da Oi foi a segregação da rede de fibra em uma empresa nova, hoje chamada de V.tal. A telecom vendeu por R$ 12,9 bilhões 51% dessa empresa para o BTG Pactual. A ideia é que, com um sócio capitalizado, essa nova companhia possa investir mais na expansão de fibra óptica pelo país. O plano é aportar R$ 30 bilhões nos próximos quatro anos.

Você não vai poder contratar a V.tal. Ela oferecerá uma rede neutra, e qualquer companhia poderá pagar para usar essa infraestrutura e vender serviços de banda larga. Nisso, a Oi perde a exclusividade, mas, se o plano der certo, ganha escala. A companhia já tem 400 mil quilômetros de fibra instalados e quer chegar a 34 milhões de casas.

A Oi avalia que a V.tal tem valor de mercado de R$ 20 bilhões. No arranjo final com o BTG, porém, a tele ficou com 34% da companhia. Dá R$ 6,8 bilhões, o que cria uma situação bastante inusitada: só a fatia da V.tal valeria mais que o dobro da Oi inteira na bolsa.

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(Divulgação/Oi/VOCÊ S/A)

É fato que a diluição da Oi na V.tal foi mal recebida pelo mercado. Mas existe um outro fenômeno curioso acontecendo com a companhia. Quanto mais perto ela está de deixar a recuperação judicial, mais as ações caem. No fim de julho, elas estavam cotadas a 0,47 centavos, perto do menor patamar da história.

Existem algumas razões para isso.

A primeira é que não basta terminar a recuperação judicial. A empresa precisará caminhar com as próprias pernas. O lance é que os resultados financeiros dessa virada de chave devem começar a aparecer de verdade só em 2025. Quer dizer: entre o pedido de recuperação judicial e a volta aos anos de glória, caso eles retornem, terá se passado quase uma década – um longo inverno em que a companhia pede, antes de nada, paciência ao investidor.

Enquanto isso, o curto prazo se mostra bastante desafiador. Por causa da conclusão das vendas da V.tal e da Oi móvel, a companhia divulgou seus dados do primeiro trimestre apenas no fim de junho.

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No primeiro trimestre de 2022, a empresa registrou a segunda menor receita operacional desde o 1º tri de 2020. Foram R$ 4,4 bilhões. Dá uma queda  de 7% no horizonte de dois anos. Em defesa da Oi, ela conseguiu registrar lucro no período – R$ 1,8 bilhão. O lance é que os lucros trimestrais que a empresa registra aqui e ali não têm sido o bastante para fechar um ano no azul.

A companhia tem conseguido avançar na venda de internet fibra residencial e faturou R$ 851 milhões com isso no primeiro trimestre – já respondendo pela maior fatia da receita operacional. O problema é que o ganho nesse mercado ainda não é capaz de compensar a perda nas outras linhas de negócio. No segmento residencial, os serviços via fios de cobre (telefone fixo e internet banda lesma) ainda geram R$ 436 milhões – mas estão caindo paulatinamente.

Existe um motivo conjuntural e outro estrutural. A inflação de dois dígitos que consome o salário dos brasileiros inibe o apetite por planos de internet mais robustos e ainda aumenta a inadimplência. O problema, diga-se, não é só nos contratos residenciais. A Oi também teve queda de receita no segmento empresarial, dada a maior dificuldade financeira das empresas.

O BB UBS afirmou em relatório que o aumento da competição dificultará a vida da Oi. Diz que ela terá problemas em repassar aumentos de preços e ainda poderá ver seus concorrentes, com mais dinheiro em caixa, avançar em aquisições de provedores menores. O banco de investimentos prevê que as receitas da Oi continuarão a cair até 2026. E só naquele ano a tele voltará a registrar lucro anual.

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(Arte/VOCÊ S/A)
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Do lado estrutural, o problema é que a companhia não pode simplesmente parar de oferecer os serviços ligados à rede de cobre, não só porque perderia uma receita ainda monstruosa, mas porque se trata de um pedaço da concessão pública. A Oi afirma que uma parte importante da sua crise está ligada às amarras que o contrato de concessão impôs após a privatização. O mercado mudou, quase ninguém quer saber de telefone fixo – quem dirá orelhão, que também usa as linhas de cobre – e, mesmo assim, ela é obrigada a manter uma parte da infraestrutura funcionando.

Uma das incertezas que ainda pairam sobre a Oi é justamente a disputa travada com a Anatel (a agência reguladora do setor). Existe uma negociação amigável com a agência, e também uma disputa arbitral (quando empresa e agência contratam árbitros para chegar a uma avaliação independente do problema e decidir quem deve ser indenizado).

As telecoms querem ser compensadas pelos investimentos feitos na rede de telefonia fixa, sob imposição de contratos, já que a tecnologia se tornou obsoleta. A Anatel afirma, por outro lado, que uma mudança do regime de concessão para o de autorização (com menos exigências) aliviaria a carga de investimentos das companhias – então elas é que deveriam compensar o governo. Eis uma pendência que deve levar pelo menos mais dois anos para se resolver.

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Rodrigo Abreu virou CEO da Oi em 2019, e comandou o plano de recuperação da companhia. (Divulgação/Oi/VOCÊ S/A)

O mundo mudou

Nos anos em que a Oi tocava sua recuperação judicial, passaram-se umas três vidas no mercado financeiro. A taxa Selic terminou 2019 em 4,50% – e cedeu até os 2% vistos na pandemia. Hoje, ela já saltou de volta para perto de 14% ao ano. O dólar também disparou, saiu dos R$ 4 ao fim de 2019 para a faixa de R$ 5,20 no fechamento de julho. 51% da dívida da Oi é em dólar.

A companhia havia previsto que a venda da Oi Móvel e da V.tal sairia em 2021, quando a grana entraria na conta para pagar as dívidas. Não rolou. E aí o bolo dos juros continuou a crescer, como acontece com todo mundo que tem boletos atrasados. Essa grana só entrou na conta da Oi no segundo trimestre de 2022. Antes disso, a dívida líquida da empresa havia subido para R$ 31 bilhões no final do primeiro trimestre, dos quais R$ 2,6 bilhões tinham vencimento em um ano.

E a dívida que restará depois da recuperação judicial também é um ponto de preocupação dos investidores, especialmente porque a Oi não deverá gerar caixa o suficiente para quitá-las. O BB UBS prevê que a dívida líquida cairá para R$ 12,95 bilhões neste ano, mas voltará a subir até 2028. E a julgar pelas condições atuais de mercado, ela será mais cara.

Nesse emaranhado, o banco reviu sua recomendação de investimento para a ação e passou a ter uma avaliação neutra – nem comprar, nem vender. Antes, ele sugeria a compra do papel com preço-alvo de R$ 1,70. A estimativa foi cortada para R$ 0,60 – ante os R$ 0,47 do fim do mês de julho. Ainda dá uma alta de 28%.

A corretora Genial fez o movimento contrário: tinha viés neutro, e passou a sugerir compra com preço-alvo de R$ 1,10. O BTG Pactual é ainda mais ousado e estima que a companhia subirá a R$ 2,30, com recomendação de compra.

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(Arte/VOCÊ S/A)

Nos últimos anos, os ânimos sobre a Oi realmente mudaram. A Empiricus, por exemplo, recomendou a compra da ação em agosto de 2019. Na época, ela era negociada a R$ 1,45. Em abril deste ano, quando o papel estava cotado a R$ 0,85, a casa de análise afirmou que a mudança do cenário econômico deixava a ação menos atrativa – mesmo que a Empiricus ainda tivesse boas perspectivas para a companhia no longo prazo. Era chegada a hora de vender, afirmou o co-CEO Felipe Miranda. Se o assinante da casa de análise seguiu as duas sugestões, saiu três anos depois com um prejuízo de 42%. Se o mesmo investidor tivesse comprado um ETF de Ibovespa, teria lucrado 14,45%.

Por sinal, as ações da Oi não cruzam a barreira do R$ 1 desde 9 de fevereiro de 2022. Elas se transformaram, oficialmente, em uma penny stock, ainda que precisem mudar sua condição em breve.

Pelas regras da B3, um papel não poderia passar mais de 30 dias negociado na casa dos centavos. O problema de ser uma ação tipo penny é a alta volatilidade. Qualquer variação, por mínima que seja, gera percentuais brutais. Se a ação é negociada a R$ 0,50 e sobe a R$ 0,55, já temos uma alta de 10%. Isso desorienta o mercado.

Por estar em recuperação judicial, a Oi ganhou algumas colheres de chá da B3. Ainda assim, agora em agosto, ela deverá fazer um grupamento de ações – em vez de um investidor ter três papéis de R$ 0,50, ele passa a ser dono de um único só com valor de R$ 1,50, por exemplo.

Não era isso que o investidor da Oi tinha em mente quando sonhava com as ações de volta ao time de elite da bolsa. A esperança, agora, está no fim do processo de recuperação judicial. Com a página virada, gestores de fundos e investidores institucionais serão liberados para voltar a comprar ações da companhia, o que poderia ajudar a tirar o papel da lama. Já os tempos de ouro dos lucros… Esse talvez exija do investidor uma mentalidade de longo prazo.

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