Sequência de altas coloca o Ibovespa na beira do bull market
O “mercado touro” se confirma quando o índice sobe 20% desde a mínima mais recente. A bolsa brasileira avança 18,8% desde o fim de fevereiro.
Depois de oito altas seguidas e seis pregões de recorde, o Ibovespa se aproxima de mais um marco daqueles que investidores amam: está com o pé na beirinha de um bull market.
O touro virou há muito tempo o símbolo da alta das bolsas, você sabe por causa da estátua em Nova York. O motivo original da escolha do touro não se sabe, mas entrou para o folclore de Wall Street a seguinte explicação: o animal ataca debaixo para cima, dando chifradas que formam o desenho de um gráfico de ações quando elas estão subindo.
O urso, o oposto do touro no mercado, tem uma explicação mais concreta. Vem de um provérbio inglês que falava em “Vender a pele do urso antes de caçá-lo”, algo a ver com a venda a descoberto – a técnica para lucrar com a queda das ações. O lance é que os ursos atacam no sentido contrário do touro, de cima para baixo, também emulando o gráfico de alguma maneira.
Só que não é qualquer alta que faz um mercado touro: ele começa a contar quando as ações acumula uma alta de 20% em relação ao vale mais recente (o bear market o oposto, uma queda de 20% após a máxima recente). Esse fundo do poço foi no último pregão de fevereiro, quando o Ibovespa caiu aos 110.035 pontos. Até os 130.776,27 desta segunda, a valorização acumulada é de 18,85%, o que nos coloca pertinho dessa marca simbólica.
O último bull market foi mais ou menos ontem, foi de novembro de 2020 a janeiro de 2021, quando o índice havia chegado ao recorde anterior de 125 mil pontos. A valorização acumulada tinha sido de 33% até o período de queda e relativa estabilidade.
O ponto é que, mesmo na virada do ano passado, o índice não havia emendado uma sequência tão longa de valorizações. A última vez que o Ibovespa enfileirou nove altas seguidas foi em fevereiro de 2018 (quem recuperou o histórico foi o Estadão).
Me dê motivos
Já faltam fundamentos econômicos para explicar uma alta tão substancial, mas o fato é que investidores pegaram embalo no otimismo.
Nesta segunda, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, afirmou que o governo deve ampliar por mais dois meses o auxílio emergencial, o que significa um gasto de mais R$ 12 bilhões fora do Orçamento, segundo dados do Broadcast. Quando lançou a segunda rodada do auxílio, o governo separou R$ 44 bilhões para os pagamentos.
O normal seria investidores se preocuparem com as despesas extras, mas não fez nem cosquinha no Ibovespa. A Faria Lima preferiu dar atenção a outras declarações de Lira. Ele prometeu que o Senado deve votar em breve a proposta de capitalização da Eletrobras (apesar de o texto ter incomodado o mercado financeiro), além de indicar andamento das reformas administrativa e tributária.
Foi o que deu fôlego para a bolsa ao longo da tarde, e o Ibovespa chegou a superar os 131 mil pontos no melhor momento. Depois o mercado achou que não era para tanto.
Mas não é que o mercado financeiro tenha ignorado o risco fiscal de aumento de gastos, longe disso. O que aconteceu é que eles canalizaram a energia no mercado de juros. Os principais contratos fecharam nas máximas. O DI com vencimento em janeiro de 2022 fechou em 5,110% (ante 5,056% na sexta-feira). O contrato para janeiro de 2027 subiu a 8,320% (antes 8,244%).
Azul e Latam
A maior alta do dia foi da Azul. O Bradesco BBI divulgou um relatório em que calculava os ganhos financeiros (chamados de sinergias no mercado) caso a companhia fundada por David Neeleman compre a operação da Latam no Brasil – o lance é que a Latam já disse que não está à venda. Nas contas do banco, essas sinergias chegariam a R$ 9,5 bilhões. Com base nisso, a instituição recomendou a compra de ações da Azul e disse que elas podem bater R$ 75 – hoje, depois da alta de quase 6%, elas fecharam em R$ 47,20. A Latam também teve recomendação de compra elevada, mas a companhia não é negociada em bolsa, apenas no mercado de balcão.
A Gol pegou carona no noticiário e também marcou presença nas maiores altas do dia.
Lá fora
Se aqui no Brasil a sensação de investidores é de que só há um caminho para as ações, nos EUA acontece o oposto. Por lá, o Dow Jones caiu, o S&P 500 terminou praticamente estável, enquanto o Nasdaq avançou.
Eles continuam ansiosos com a inflação do país. Na quinta, saem os dados de maio (a nossa inflação de maio, que também preocupa, vem um dia antes, na quarta).
O lance é que a secretária do Tesouro Americano, Janet Yellen, afirmou que subir os juros seria positivo para a economia dos EUA. Ela, não custa lembrar, já foi presidente do Fed (o Banco Central deles).
O lance é que a gestão atual do Fed (de Jerome Powell) continua dizendo que é cedo demais para tirar os juros do país do zero.
Olá, dólares
Ok, esse é mais um motivo para a recuperação do Ibovespa. Apesar desse vai-não-vai da inflação americana, investidores voltaram a se conformar com o juro zero. Quer dizer, conformados eles não estão, tanto que saíram mundo afora atrás de rendimentos mais polpudos – o que só é possível encontrar aceitando correr mais riscos, como trazer dinheiro para o Brasil.
Em maio, entraram R$ 12,2 bilhões de dinheiro estrangeiro, o segundo maior volume do ano – atrás apenas de janeiro. Em dois pregões de junho (os dados da B3 saem com atraso) já vieram outros R$ 3,9 bilhões.
Para além do empurrão na bolsa, esse dinheiro – junto com o crescimento das exportações de commodities – finalmente trouxe um alívio para o dólar, agora ao redor dos R$ 5. Eis um bom jeito de começar a semana: com boas notícias. Até amanhã!
MAIORES ALTAS
Azul 6,24%
Natura 4,72%
Energisa 3,93%
GOL 3,85%
IRB 3,61%
MAIORES QUEDAS
Pão de Açúcar -3,86%
PetroRio 3,71%
Banco Inter -3,44%
CSN -2,78%
Marfrig -2,56%
Ibovespa: +0,50%, a 130.776,27 pontos
Dólar: +0,03%, a R$ 5,0369
Nova York
Dow Jones: -0,37%, a 34.630,24 pontos
S&P: -0,08%, a 4.226,52 pontos
Nasdaq: +0,49%, a 13.881,72 pontos
Petróleo
Brent: -0,56%, a US$ 71,49
WTI: -0,56%, a US$ 69,23
Minério de ferro: -2,38%, a US$ 202,42 a tonelada no porto de Qingdao