Steve Jobs, o cara de US$ 300 bilhões
Essa seria a fortuna dos herdeiros de Jobs se ele não tivesse vendido suas ações da Apple. Sem essa venda, porém, a empresa não teria se tornado a mais valiosa do planeta. Veja como essa história mostra o que há de mais fascinante no ato de empreender.
Steve Jobs tinha 11% da Apple no início dos anos 1980. Foi o que sobrou para o fundador depois de várias rodadas de investimentos, com novos sócios entrando paulatinamente no negócio desde a fundação, em 1976.
Parece pouco. Não é. Isso fazia de Jobs o maior acionista. Só que ele não tinha o controle total da empresa. Você só pode mandar e desmandar à vontade, sem a obrigação de combinar com os russos (os outros acionistas) quando possui mais de 50%. Mas Jobs não era muito de pedir licença. Ainda mais porque ele mesmo tinha trazido, em 1983, o sujeito que ocupava o cargo de CEO na Apple, John Sculley, ex-presidente da Pepsi. Para convencê-lo, disse: “Você quer vender água com açúcar para o resto da vida? Ou quer vir comigo e mudar o mundo?”.
Poesia à parte, não demoraria para os dois baterem cabeça. Em 1985, depois de uma série de rusgas entre Jobs e Sculley, o conselho de administração entendeu que a Apple era pequena demais para os dois. E preferiu Sculley. Jobs foi proibido de exercer funções executivas na empresa. Para todos os efeitos, estava demitido.
Ele poderia seguir como acionista, claro. Mas ficou mordido, e optou pelo divórcio completo: vendeu seus 11%. A Apple estava em baixa naquele momento. Valia US$ 1,3 bilhão – contra US$ 4,4 bilhões do último pico, em 1983. Mesmo assim, os 11% de Jobs renderam respeitáveis US$ 144 milhões. Corrigindo pela inflação, dá US$ 370 milhões – cinco vezes o prêmio da última Mega-Sena da Virada.
Jobs pegou o dinheiro e colocou em em dois negócios: a NeXT, uma fabricante de computadores que ele criou para concorrer com a Apple. E a Pixar, um estúdio que passou a ter como objetivo lançar a primeira animação em longa metragem feita por computador.
E Jobs triunfou. Tim Berners-Lee, o inventor da internet como a conhecemos, usou um desktop da NeXT em 1990 para criar o primeiro site da história e o primeiro browser da história. Em 1993, Jobs lançou a primeira loja online de apps, no sistema operacional da NeXT. Pouco depois, sua nova empresa forneceria a tecnologia de geolocalização para o primeiro serviço de entrega de comida online (o Cyberslice). Na Pixar, o sucesso veio em 1995: o estúdio lançou Toy Story, cumprindo a meta de produzir o primeiro longa de animação 100% CGI.
Enquanto Jobs mudava o mundo, a Apple rumava à falência. Nada que a empresa lançasse dava certo. E o conselho administrativo pediu socorro ao fundador. Em 1996, ofereceu 1% das ações da companhia para que ele voltasse, levando a NeXT para dentro da Apple. Jobs aceitou, e no ano seguinte assumiu como CEO. Para salvar a companhia, pediu ajuda à Microsoft.
Convenceu Bill Gates a pagar US$ 150 milhões em troca de uma fatia da Apple. O dono da Microsoft não topou por caridade – é que sem a concorrência dos Macs ele provavelmente teria problemas com as leis antitruste. Seja como for, Jobs tinha encontrado o dinheiro que a Apple precisava para respirar. “Obrigado, Bill. O mundo é um lugar melhor agora”, disse ao rival.
E o resto é história. Com Steve de volta, vieram o iMac, o iPod, o iPhone… E o valor de mercado da empresa subiu de US$ 1,9 bilhão em 1997 para US$ 235 bilhões em 2011, o ano da morte de Jobs. Um salto de 12.000%. Tim Cook, sucessor fiel à filosofia change the world do fundador, puxou mais 1.200% de alta desde então – e em janeiro de 2022 a Apple se tornaria a primeira empresa da história a valer US$ 3 trilhões.
Note que a fabricante do iPhone não tem nenhum mega-acionista individual hoje. A família de Jobs possui 0,25%. Tim Cook, 0,02%. Os bocados maiores, de 1% a 7%, ficam com grandes fundos de investimento (Black Rock, Vanguard, Berkshire). Cada pedaço maior está diluído entre milhares de cotistas.
Se Jobs tivesse mantido aquela fatia de 11%, seus herdeiros teriam hoje mais de US$ 300 bilhões – e formariam a maior fortuna do planeta, bem acima dos US$ 220 bilhões de Elon Musk. Por outro lado, a Apple só virou o que é hoje porque Jobs vendeu as ações lá em 1985. Sem aquele movimento, não haveria a NeXT (nem a Pixar); sem a NeXT, Jobs não teria sido chamado de volta, e sem o retorno dele a Apple provavelmente teria fechado as portas.
E Jobs não teria virado o maior acionista de outra companhia: a Disney. Em 2006, o conglomerado do Mickey cedeu uma fatia de 7% para Steve em troca da Pixar. É daí que vem o grosso dos US$ 18 bilhões que o fundador da Apple deixou de herança. Uma bela amostra de que o mais fascinante da vida é sempre o caminho, não o destino.