Sustentabilidade humana: sua empresa coloca em prática?
Garantir um ambiente corporativo saudável é tão importante para as pessoas quanto para os resultados financeiros da organização.
termo “sustentabilidade humana” é recente no mundo corporativo, mas seu significado não é novo. Partindo do princípio de que as pessoas – consumidoras, fornecedoras, parceiras, lideranças e, principalmente, colaboradoras – estão no centro das organizações, passamos a enxergar uma necessidade de mudança de paradigma em prol desse capital humano.
A empresa de consultoria global Deloitte usou esse conceito pela primeira vez em um relatório em 2023, definindo sustentabilidade humana como a necessidade de as organizações focalizarem menos em como as pessoas podem beneficiá-las e mais em como elas mesmas podem beneficiar as pessoas.
Ou seja, trata-se de uma nova abordagem em que as empresas precisam tornar o ambiente corporativo sustentável para que as pessoas desempenhem seus papéis da melhor forma possível. Isso, por fim, se reflete na sustentabilidade do próprio negócio.
O conceito é conhecido, mas pouco concretizado. Segundo dados da própria Deloitte a partir de entrevistas com lideranças, há uma lacuna entre quem reconhece a importância desse tema (76% das pessoas respondentes afirmaram que é algo importante para o negócio) e quem o exerce no dia a dia (46% disseram fazer algo a respeito, e 10% já investem em ações de grande porte).
Então como fazer para colocar em prática? A primeira e mais importante etapa é medir. Quais são os impactos de um ambiente corporativo ruim para as pessoas nos resultados? Quanto custa o absenteísmo, a desmotivação, a baixa produtividade, o turnover, as consultorias e os treinamentos?
Um dos desafios da sustentabilidade humana é que ainda se privilegia um olhar apenas para os resultados técnicos, o que se estende para a forma como as pessoas são avaliadas.
No meu livro Viés Inconsciente, menciono um treinamento que dei para um time de RH sobre como o ambiente de trabalho pode influenciar nas descargas hormonais. Logo depois, duas pessoas pediram demissão, e as lideranças vieram reclamar para mim. Falei que o problema não era o treinamento e nem as pessoas, mas provavelmente a liderança. Além disso, os motivos da saída poderiam dar uma pista sobre o que estava ocorrendo.
Comportamento é tão importante quanto o saber técnico
É comum que pessoas cheguem a cargos de liderança por suas qualidades técnicas e, na hora de desempenharem esse papel, apresentam falhas no lado comportamental. Esquecem de fazer reuniões individuais, de dar feedbacks constantes e de criar um ambiente acolhedor, de empatia e inclusão. Em vez disso, focam em cobranças e pressão por resultados.
Sustentabilidade humana é a necessidade de as organizações focalizarem menos em como as pessoas podem beneficiá-las e mais em como elas mesmas podem beneficiar as pessoas.
Em outro exemplo, uma pessoa que participava de um treinamento veio reclamar para mim que tinha muitos problemas com as pessoas da sua equipe – tanto homens quanto mulheres não vinham performando bem. Logo perguntei: “você faz reuniões com elas? Tem momentos one-to-one?” A pessoa respondeu: “Faço uma vez com o time todo e sempre digo que, se tiverem ‘algo urgente’ (em um tom bem ríspido), podem me procurar”.
Foi curioso perceber que essa liderança nunca havia questionado o tom dessa fala. Afinal, o que é urgente? Assim, estava transmitindo que era alguém superocupado, que não tinha tempo para assuntos triviais. Não percebia que seu time acabava preferindo fazer errado do que falar e tirar dúvidas. Quando falei isso, caiu a ficha!
Essa liderança não fazia isso por ser alguém ruim, mas por hábito e porque a organização nunca olhou para o perfil comportamental dela. Daí a importância de treinamentos de liderança inclusiva, além de incluir nas avaliações de desempenho o feedback 360, em que todas as pessoas são avaliadas por todos os níveis da hierarquia, de forma igualitária.
É tempo de delicadeza
Gosto muito de um modelo de uma empresa que prestei consultoria. A avaliação é dividida em duas partes iguais: 50% atributos técnicos e 50% atributos comportamentais. A pessoa pode tirar nota 10 na primeira, mas, se não pontuar bem na segunda, não recebe promoções ou bônus — e aí deve desenvolver melhor as competências para o próximo ciclo.
A sustentabilidade humana está diretamente relacionada à maneira com que as empresas tratam as suas pessoas. Isso passa por esse olhar profundo que mencionei sobre as métricas de desempenho comportamental das lideranças e os impactos do turnover e absenteísmo para as finanças.
Um dos desafios da sustentabilidade humana é que ainda se privilegia um olhar apenas para os resultados técnicos, o que se estende para a forma como as pessoas são avaliadas.
Envolve também atitudes tão singelas quanto, no dia a dia, usar mais expressões como “parabéns pela entrega” e “obrigado pelo trabalho”. Ou, caso a tarefa precise de ajustes, falar que “precisamos corrigir um pouco a rota, vamos trabalhar em conjunto nisso”.
A cultura de uma empresa não é somente o que está escrito nas paredes sobre respeito, propósito e trabalho em equipe. É, principalmente, a maneira como as pessoas se comportam. Por isso, a sustentabilidade humana deve ser medida e colocada como uma meta: garantir um ambiente saudável para que a pessoa vá para casa melhor do que quando chegou ao trabalho.